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domingo, 31 de março de 2013

Milagre de Páscoa

O post de hoje vai fugir levemente da proposta inicial desse blog, mas como foi algo de extrema significância, acho válida a sua presença. E como tudo que nos é emocionante e grandioso certamente é relevante, então vamos nós:

Hoje, 31 de março de 2013, acordei com uma vontade de praticar alguma atividade física ao ar livre em vez de me enfurnar na academia. Liguei para duas amigas e marcamos de dar uma volta de bicicleta.
Estava indo ao encontro delas, passando pelo calçadão de Copacabana, quando avistei um burburinho, uma roda de capoeira, ao fim da orla, em frente a vila dos pescadores. Vi o Ferradura, que certa vez vi jogar com o meu professor na roda do Mercadinho, então deduzi que era uma roda de Angola, mandei o meu axé e continuei a pedalar, afinal minhas amigas me esperavam no final do Leblon. Chegando lá, encontrei com elas e agora o roteiro era voltar tudo de novo e ir até o Leme.

Mais uma vez passei pela tal roda, que ainda estava danada de boa e não dava sinais de acabar. Mas, como estava acompanhada, passei reto mais uma vez e conclui o trajeto até o fim dessa faixa de areia. Para terminarmos o passeio com chave de ouro, pensamos em repetir o trajeto uma última vez e dar um mergulho no Arpoador. Pronto, era a minha hora. Pedalei com a maior força de vontade que o meu jejum até então podia fornecer e cheguei na roda de Angola uns cinco minutos antes das minhas amigas.

Saltei da bicicleta e fui bisbilhotar o que acontecia. Não acreditei no que vi. Lá, misturado e envolvido como qualquer outro capoeirista, estava sentado João Grande, miúdo e ao mesmo tempo enorme, com o seu berimbau pintado cheio de tartaruguinhas. Quando as duas chegaram pedi que não se preocupassem mais comigo, eu ficaria ali até a roda acabar.
Peço lincença aqui pela minha ignorância sobre a capoeira Angola. Certamente, não saberei relatar tão bem o que aconteceu na meia hora seguinte em que permaneci por lá. Com certeza havia outros Mestres também de extrema importância, mas que, infelizmente, fugiam do meu conhecimento. Mas como a frustração não é o meu forte, prefiri pensar que ainda viveria aquele momento de novo, de forma capaz a valorizar cada um presente.

Os jogos de Angola já deviam ter acabado, pois o que vi foram apresentações criativas, misto de capoeira e circo. Jogos com bolas e acrobacias que até então eu não conhecia. Um festival de mulheres empolgadas, devidamente "embaianadas" de energia contagiante que não paravam de pedir por um coro alto e energizante. E eu só conseguia olhar para o Mestre.

Mestre João Grande durante a roda
Depois disso começou uma sequência inesgotável de sambas de roda com músicas lindíssimas e cinturas soltas. Pasmem! Pela primeira vez não consegui recusar quando um homem me puxou para o meio da roda! Já cansei de participar de sambas, mas nunca ousei sambar. Só que não era qualquer dia que eu poderia dançar ao som do berimbau de João Grande.

Fiquei muito nervosa quando percebi que a roda estava acabando e que chegaria o momento de eu me aproximar dele para pedir uma foto. Mas, para a minha decepção, assim que ela foi encerrada um dos Mestres que a ministrava falou "Vamos tirar o João desse sol e levá-lo para outro lugar para ele descansar". Murchei na hora, mas entendi que era egoísmo demais da minha parte querer que ele desse atenção a todos. Fui encontrar as minhas amigas, que haviam ido para areia dar um mergulho no mar. Conversei com elas uns 15 minutos e depois falei "Vou voltar! Vai que deu uma esvaziada e ele continua lá!". E lá estava João Grande, sentado em um banquinho na vila dos pescadores, dando ouvidos a quem vinha falar com ele.
Fiquei meio constrangida, por estar de biquini, por não ser angoleira, por não conhecer ninguém ali. Mas não poderia perder a oportunidade de ter um contato com ele. Pedi para uma mulher tirar uma foto nossa e ela disse "Você já conversou com ele? Ele não gosta que cheguem só para tirar foto e vá embora. Ele prefere ter um momento do que uma foto". Óbvio! Que insensibilidade a minha! Fiquei o tempo todo querendo uma foto para poder registrar o momento e a sorte desse dia, mas não percebi o quão mais valioso era ter uma palavra, um toque dele, que poderia ser muito mais imortalizado comigo do que com um pedaço de papel.

Por isso, esperei um pouco, me ajoelhei em sua frente, beijei sua mão, pedi a sua benção e o contei que era da ABADÁ. Ele sorriu com o melhor de seu carisma e humildade e disse estar feliz com a presença de uma jogadora de regional. E só. Dei a vez para mais uma pessoa que aguardava para receber um pouco dessa energia e fui embora. Sem foto e feliz. Com o coração apertado de emoção, querendo muito repassar esse amor para qualquer pessoa que pudesse entender a importância daquele momento, daquela explosão de sentimentos inexplicáveis.
Obrigada Deus, por me enviar, não em forma de Mestre, mas de energia, esse milagre de Páscoa.

Ele, quando eu voltei depois

terça-feira, 26 de março de 2013

Mestre Bimba - A Capoeira Iluminada

Esse post é abrangente, uma dica para todos, capoeiristas ou não.

Se você é um praticante dessa arte e ainda não viu Mestre Bimba - A Capoeira Iluminada, envergonhe-se. O documentário de Luiz Fernando Goulart é rico em todos os aspectos: cinematograficamente, historicamente, culturalmente e capoeiristicamente. 


Com participações e entrevistas excepcionais de grandes capoeiristas, alunos seus, como Mestre Decânio, Mestre Acordeon, Mestre Itapoan e Mestre Camisa, o longa-metragem conta a história dos Mestres dos Mestres desde o seu primeiro contato com a capoeira, quando ainda era estivador na Bahia. Até seus últimos momentos, com relatos emocionantes de seus filhos e algumas de suas diversas esposas. É impossível não assistir e se contagiar com a perseverança tão rígida, mas, ao mesmo tempo, tão cativante de Bimba. Você conclui, como mesmo dito na obra, que Bimba "não foi só um mestre de capoeira, foi um construtor de homens."


A primeira vez em que o assisti tinha poucos meses na capoeira e, mesmo assim, fui cativada instantaneamente. Ele prende a atenção de capoeiristas ou não, pois não se limita a atividade, mas, principalmente, a encaixa em um contexto histórico, tornando-se minimamente interessante para qualquer um que assista. Antes de qualquer apresentação de Manoel dos Reis Machado, o Mestre Bimba, há a história libertária dos negros e de sua cultural em um momento pós-escravidão, passando pelo batuque, o candomblé, a estiva, e outros tantos pontos marcantes dessa época.


E, aproveitem, mesmo depois de lançado em DVD pela gravadora Biscoito Fino, o documentário ainda se encontra na íntegra no YouTube:




"Mestre Bimba, marca a gente a ferro e fogo naquela fibra mais escondida do coração", Mestre Decânio.

Ficha Técnica:
Diretor: Luiz Fernando Goulart
Produção: Nina Luz, Claudia Castello
Roteiro: Luiz Carlos Maciel
Fotografia: Rivaldo Agostinho de Lima Filho (Dody)
Trilha Sonora: Fernando Ariani

segunda-feira, 25 de março de 2013

A temida segregação - homens e mulheres!

Jogos Femininos de 2012


Sempre enxerguei a capoeira como a luta mais democrática do mundo. Em meio a competições que separavam os concorrentes somente por suas graduações, via-se jogos entre Davids e Golias, Gordos e Magros, jovens e idosos e, é claro, homens e mulheres.

Encantada por essa unicidade do grupo, a minha primeira reação ao saber, no ano passado, da divisão de sexos nas competições foi de decepção. "Mas como cortar as raízes? Desde os tempos das senzalas, homens e mulheres, meninos e meninas, sempre jogaram juntos, como irmãos!". Mas é claro que, mais um vez eu seria surpreendida pelo brilhantismo de Mestre Camisa.

Conversando com a professora e campeã brasileira Juma ela me explicou: "essa segregação aumentará a aceitação da capoeira pelos leigos que, ao ver um homem dar um golpe, uma rasteira em uma mulher, acha grosseiro". Nós sabemos que na hora da roda todos tem a capacidade de jogar de igual para igual, mas os não praticantes não sabem. Camisa, sendo o bom discípulo de Mestre Bimba que é, pensa na capoeira para o mundo e não somente para os capoeiristas. "Além do mais, essa transformação incentivará mais a participação das mulheres nas competições, que se sentiam  desmotivadas para competir com grandes nomes de peso nos campeonatos". 

Aceitei que a mudança é para o bem. Não é uma perda de raízes, mas sim um amadurecimento natural do esporte.
"Não tenho medo de mudar de opinião, pois não tenho medo de pensar!", axé!

Domingo teve roda no Jardim América

Uma das rodas mais tradicionais do subúrbio, na praça do bairro Jardim América, é sempre realizada domingo sim, domingo não, pelo Mestre Morcego ou por um de seus alunos. Iniciada há quase 20 anos, a vadiação é sempre variada, abraçando homens, mulheres, crianças e até visitas de capoeiristas de outros grupos, vez ou outra.

Mas esse domingo foi atípico. Comandada pelo seu Mestre, a roda estava especialmente cheia - como há muito não se via - a energia contagiante e os jogos gostosos e ponderados.


Foi iniciada com belas sequências de Santa Maria, raros em rodas de rua da ABADÁ, seguido por jogos de Angola e por fim, Benguela e São Bento Grande, todos embalados pelo canto solto dos Instrutores Sorriso, de Brasília, e Gordinho. Os capoeiristas e curiosos não pararam de chegar e o ritmo foi intenso até o último "iê!", quando o Morcego finalizou a confraternização com um belo discurso de noção de jogo e paciência.


Para terminar tudo com um astral nas alturas nos reunimos para cantar alguns hinos do grupo em alto e bom som, contagiando até os que não estavam na brincadeira.


Para voltar para a casa com as energias renovadas (pois o espírito, a roda já se encarrega de alimentar) na esquina tem o frango assado mais famoso do subúrbio, com direito a farofa e batatinha portuguesa, e um belo sucolé para refrescar a alma.


Dia 31 - isso mesmo, na Páscoa - tem mais! Tem forma melhor de comemorar uma data religiosa do que com muito axé e contato divino em uma roda de capoeira? Então até lá!


Jogo de Santa Maria


quinta-feira, 7 de março de 2013

As boas-vindas

Olá!
Meu nome é Cristal Lomba Fontana, tenho 22 anos e faço jornalismo na PUC-Rio. Como esse espaço, se tudo der certo, vai virar um portal para os capoeiristas do grupo ABADÁ, tão importante quanto apresentar o meu nome, é apresentar o meu apelido: que também é Cristal. No dia do meu batizado de capoeira, os professores e instrutores acharam que o meu nome já era exótico o suficiente e resolveram continuar me chamando assim. 

Mais importante do que apresentar o meu currículo acadêmico e outros tipos de formações, é contar o meu papel e a minha relação com esse grupo e com esse esporte.

Entrei na aula de capoeira em agosto de 2010 sem nenhuma pretensão, por puro desejo de fazer algum tipo de atividade física. E, desde a primeira aula, me encantei de uma forma que nunca havia me encantado com algum outro tipo de manifestação cultural na minha vida, entre músicas, esportes, espetáculos... Até por que entendi que todos esses exemplos estavam juntos em uma só sala, sob o comando de um professor, o Morceguinho.
Logo no início comecei a respirar e a comer capoeira, não faltava nenhum treino e, sempre que possível, participava de atividades extra-sala de aula. Cheguei até a pensar que era somente uma empolgação inicial minha, afinal, tendo a agir de forma compulsiva com tudo o que me envolvo. Mas os meses foram passando, muitas coisas foram mudando, e a capoeira continuou firmemente ativa em minha vida. Hoje, tenho certeza de que não conseguiria mais viver sem, nela encontro o meu equilíbrio físico, mental e espiritual. 

Ainda sou um bebê engatinhando nessa atividade. Estou na minha quarta corda, a amarela e laranja, mas a ansiedade de crescer cada vez mais, por incrível que pareça, só me dá um conforto de saber que ainda tenho uma vida inteira para desfrutar dessa arte. 


Esse ano a ABADÁ-Capoeira - Associação Brasileira da Arte Capoeira - completa 25 anos. E após tantas experiências, emoções e aprendizados que esse grupo me proporcionou, acho que já está mais do que na hora de eu devolver a ele um pouco desse carinho.

E é por isso que estou aqui. Pelo grupo, por essa arte e por todos os capoeiristas, sejam eles da ABADÁ ou não. Para compartilhar essa paixão, para trocar figurinhas e para tentar mantê-los informados das novidades por dentro da associação. 

Por enquanto é isso, espero que essa brincadeira acrescente tanto a mim quanto a vocês.

Vamos nos falando!
Um beijo,
Cristal


Pitanga, eu, Morceguinho, Nala e Aruanã em nossa última troca de cordas